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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

PRAÇA XV, AI! O TRAMBOLHO



Daquele nostálgico e reclamante João:

...Se a gente se chega a ela, até pelos flancos, digamos pela Rua Jacó do Bandolim, para quem vem do Palácio da Justiça, o que se tem é a visão de sua morte - a visão do trambolho.

...A engenharia acionada pelos donos do poder público - e o trambolho comprova que o Rio não dói na alma ou no coração dessa gente - não contente com a construção do primeiro trambolho tratou de construir outros menores, embora igualmente sinistros.

...Era de ver. Os portugas ou os burrugas viviam pra baixo e pra cima, esporrentos e laboriosos. A camiseta de uns três botões na frente, a calça riscada, um cinto largo, a bolsa no cinto, barrigudos, tamancos nos pés, e taludos puxando o burro-sem-rabo. Ah, pedaço de Rio antigo e tão recente... Esses burrugas se mexiam pela cidade, faziam transporte de móveis de escritório e coisas puxando as alças do burro-sem-rabo. Levavam pesos consideráveis e usavam também, que me lembro, a rodilha. Era um trapo feito de saco vazio de farinha de trigo que os portugas iam enrolando, enrolando muitas vezes e, depois, o metiam sobre a cabeça.

Não se deve contar o número dos mendigos, aleijados, pivetes, abandonados e mariolando pela atual Praça XV. Seria uma ocupação macabra e esse número, lhes garanto, chegaria a bem mais de sessenta. Além da vadiagem, a viração.

Desdentadas e magrelas lá estão, perambulando à beira da obra de Mestre Valentin, hoje de águas verdejando de sujas onde se atira de um tudo, com saias compridas e lenços à cabeça umas ciganas falsas, descoradas ou de pele enferrujada, que vieram de ônibus xexelento de Nova Iguaçu ou de Caxias e que encontram poucos otários ou incautos de quem leiam a sorte nas linhas da mão.

Ai, Praça XV, de retrato tão brabo...
Até as beiradas de 1961, ou por ai, ainda era programa aprazível. Namorar, curar um porre, forrar o estômago na madrugadinha. Hoje, um comércio miserável vai misturando pipoca, o Angú do Gomes em várias carrocinhas, umas refeições chamadas populares ali ao lado das barcaças, amendoim... e dois traços marcantes de miséria urbana - a venda de espiga de milho verde a quinhentos cruzeiros e os cigarros a varejo a uns cinqüenta paus a unidade! É uma marca de miserabilidade que não se via neste Rio de Janeiro, era miserê brabo só típico no Nordeste, no Norte, do Espírito Santo para cima.



PRAÇA XV, AI! - Parte do Depoimento do Jornalista e Escritor João Antonio – publicado em 1984 (nº 20) na REVISTA DO PATRIMONIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL “A Restauração do Paço Imperial e o futuro da Praça XV no Rio”.

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